A Lei nº 14.790/2023, sancionada em 29 de dezembro de 2023, representou um marco histórico para o setor de apostas esportivas no Brasil, estabelecendo um marco regulatório claro e abrangente para essa modalidade de jogo.
A partir de 1º de janeiro de 2025, a exploração de apostas de quota fixa no Brasil se torna exclusiva para as empresas que obtiveram autorização do Ministério da Fazenda.
Ao longo deste artigo, explorarei em detalhes os principais pontos da lei, com ênfase nos artigos que tratam do processo de “Conheça Seu Cliente” (KYC) e Onboarding, e as implicações dessa nova legislação para o mercado e para a segurança das próprias casas de apostas.
Apostas esportivas e lavagem de dinheiro: um desafio global.
A prevenção à lavagem de dinheiro é uma preocupação global no setor de apostas. Nos Estados Unidos, a Financial Crimes Enforcement Network (FinCEN) estabelece normas rigorosas para as instituições financeiras, incluindo as casas de apostas.
Na Europa, a Quarta Diretiva contra a Lavagem de Dinheiro (AMLD4) impõe obrigações de identificação e verificação dos clientes. No Japão, a Financial Services Agency(FSA) supervisiona as atividades de prevenção à lavagem de dinheiro no setor de jogos de azar.
As plataformas de apostas, pela natureza de suas operações, são alvos atrativos para a lavagem de dinheiro. A nova legislação brasileira, em consonância com a Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro (PLD), busca mitigar esse risco através de medidas como o processo de “Conheça Seu Cliente” (KYC), o monitoramento constante das transações e a obrigação de reportar atividades suspeitas. A regulamentação, portanto, se mostra essencial para garantir a integridade do mercado e proteger o sistema financeiro nacional.
A regulamentação das apostas esportivas no mundo
A regulamentação das apostas esportivas varia significativamente entre os países. Nos Estados Unidos, a derrubada da PASPA em 2018 abriu caminho para a legalização em nível estadual, resultando em um mosaico de leis e regulamentos. A Europa, por sua vez, possui uma abordagem mais harmonizada, com a União Europeia estabelecendo diretrizes gerais. Já o Japão, que legalizou as apostas esportivas em 2020, adotou um modelo bastante restritivo, com foco em eventos esportivos específicos.
A lei nº 14.790/2023: um novo marco regulatório
A lei define as regras para a exploração das apostas de quota fixa no Brasil, estabelecendo requisitos para as empresas que desejam operar nesse mercado, como a obtenção de autorização do Ministério da Fazenda. Além disso, a legislação traz disposições importantes sobre a proteção do consumidor, a prevenção à lavagem de dinheiro e o combate à manipulação de resultados.
O processo de KYC e Onboarding: alicerce da regulamentação
Um dos pontos mais relevantes da lei é a exigência de um processo rigoroso de “Conheça Seu Cliente” (KYC) e Onboarding. Os artigos 23, 24 e 25 da lei detalham os procedimentos que as casas de apostas devem adotar para verificar a identidade dos seus clientes, monitorar suas atividades e prevenir fraudes.
- Artigo 23: Obriga a identificação e reconhecimento facial dos apostadores, além da implementação de sistemas de monitoramento para identificar comportamentos de risco.
- Artigo 24: Determina a manutenção de registros detalhados das operações dos apostadores, incluindo apostas, prêmios e transações financeiras.
- Artigo 25: Estabelece a obrigatoriedade de implementar procedimentos de análise de apostas para identificar transações suspeitas de lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo.
Outros artigos que indiretamente se relacionam com o KYC e onboarding:
- Artigo 7: Este artigo estabelece os requisitos gerais para as empresas que desejam operar no setor, incluindo a exigência de sistemas de segurança cibernética e a integração a organismos de monitoramento da integridade esportiva.
- Artigo 8: Este artigo obriga as empresas a adotarem políticas de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.
- Artigo 19: Este artigo trata da integridade das apostas e da prevenção à manipulação de resultados, o que também se relaciona com o KYC, pois a identificação dos apostadores é fundamental para identificar possíveis irregularidades.
Em resumo, a lei exige um processo de KYC robusto e abrangente, que inclui:
- Verificação de identidade: Através de documentos oficiais e reconhecimento facial.
- Monitoramento de atividades: Análise dos padrões de apostas para identificar comportamentos suspeitos.
- Manutenção de registros: Registro detalhado das operações dos apostadores.
- Prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo: Implementação de mecanismos para identificar e reportar transações suspeitas.
- Proteção de dados pessoais: O tratamento dos dados dos apostadores deve ser feito em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
A Importância do KYC para o mercado e para as casas de apostas
O processo de KYC e Onboarding é fundamental para a segurança e a credibilidade do mercado de apostas esportivas. Ao garantir a identificação e o monitoramento dos apostadores, as casas de apostas podem:
- Prevenir a lavagem de dinheiro e o financiamento ao terrorismo: Ao verificar a origem dos fundos e identificar transações suspeitas, as casas de apostas contribuem para o combate a atividades ilícitas.
- Proteger os consumidores: Ao identificar menores de idade e pessoas com problemas de jogo, as casas de apostas podem oferecer um ambiente mais seguro e responsável.
- Preservar a integridade do esporte: Ao monitorar as apostas e identificar possíveis manipulações de resultados, as casas de apostas contribuem para a preservação da integridade das competições esportivas.
- Garantir a conformidade com a legislação: O cumprimento das exigências legais relacionadas ao KYC demonstra o compromisso das casas de apostas com a legalidade e a transparência.
- Melhorar a reputação do setor: Um processo de KYC eficaz contribui para a melhoria da reputação do setor de apostas esportivas, que por muito tempo foi associado a atividades ilegais. O processo de KYC, fundamental para a segurança do setor, é exigido em diversos países. Nos Estados Unidos, por exemplo, cada estado possui suas próprias regras de KYC, mas a verificação de identidade é um requisito comum. Na Europa, a Diretiva de Serviços de Pagamento (PSD2) impulsionou a adoção de métodos de autenticação mais robustos, enquanto no Japão, a regulamentação exige a verificação de renda dos apostadores.
Outros aspectos relevantes da lei
Além do KYC, a Lei nº 14.790/2023 aborda diversos outros aspectos importantes, como:
- Requisitos para obtenção de autorização: A lei estabelece critérios rigorosos para as empresas que desejam operar no setor, como a comprovação de capacidade técnica e financeira.
- Publicidade e propaganda: A lei estabelece regras claras para a publicidade e propaganda das apostas esportivas, com o objetivo de proteger os consumidores, especialmente os menores de idade.
- Proteção dos dados pessoais: A lei exige que as casas de apostas tratem os dados dos seus clientes em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
- Responsabilidade social: A lei incentiva as casas de apostas a adotarem práticas de jogo responsável e a oferecerem suporte aos apostadores com problemas. Comparando com o Brasil:
Estados Unidos: “Diferentemente do Brasil, onde a regulamentação é nacional, nos Estados Unidos, cada estado possui sua própria legislação sobre apostas esportivas. No entanto, assim como no Brasil, o KYC e a prevenção à lavagem de dinheiro são requisitos essenciais.”
Europa: “A Europa apresenta uma abordagem mais madura em relação à regulamentação das apostas online, com diversos países implementando leis específicas. Embora a legislação brasileira seja recente, ela se alinha com as diretrizes europeias em relação à proteção do consumidor e à prevenção à lavagem de dinheiro.”
Japão: “O Japão, ao legalizar as apostas esportivas, buscou um modelo mais controlado e restritivo, com foco em eventos esportivos específicos. Essa abordagem difere da brasileira, que adota um modelo mais abrangente.”
Conclusão
A Lei nº 14.790/2023 representa um marco importante para a regulamentação das apostas esportivas no Brasil. Ao estabelecer um framework legal claro e abrangente, a lei contribui para a criação de um mercado mais seguro, transparente e responsável. O processo de KYC e onboarding, em particular, desempenha um papel fundamental nesse contexto, garantindo a proteção dos consumidores e a prevenção de atividades ilícitas. Em resumo, a lei:
- Regulamenta o mercado de apostas esportivas no Brasil.
- Exige um processo rigoroso de KYC e onboarding.
- Protege os consumidores e previne atividades ilícitas.
- Contribui para a integridade do esporte.
- Melhora a reputação do setor.
É importante ressaltar que a implementação da lei ainda está em curso e que diversas questões técnicas e operacionais ainda precisam ser definidas. No entanto, a aprovação dessa lei representa um passo importante para a consolidação do mercado de apostas esportivas no Brasil.
Segue abaixo o link para acesso a lei na integra, assim como o link com a lista das bets que estão homologada pelo governo:
Lei na Integra: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14790.htm
Empresas autorizadas a explorar a modalidade lotérica de aposta de quota fixa a partir de 1º de janeiro de 2025 em âmbito nacional, conforme o disposto nas Leis nº 13.756, de 12 de dezembro de 2018, nº 14.790, de 29 de dezembro de 2023, e na regulamentação do Ministério da Fazenda: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/composicao/orgaos/secretaria-de-premios-e-apostas/lista-de-empresas/lista-bets-14-01.pdf